O momento atual da pandemia foi um dos assuntos abordados pelo infectologista Estevão Urbano, em palestra virtual promovida pela Unidade de Serviço de Saúde e Segurança do Trabalho da Copasa, em parceria com a Copass Saúde. O palestrante é coordenador do serviço de Infectologia do Hospital Madre Teresa, presidente da Sociedade Mineira de Infectologia e membro do Comitê de Enfrentamento à covid-19 da Prefeitura de Belo Horizonte. Confira um resumo das principais questões apresentadas na palestra:

TRANSMISSÃO

O novo coronavírus tem uma capacidade muito grande de transmissão, que se dá por gotículas respiratórias, através da tosse, espirro, canto, fala mais intensa. Ao entrar em contato com as mucosas da face, como nariz e boca, ele se fixa e se multiplica. O modo direto se dá por proximidade. E há ainda o modo indireto, que é quando o vírus cai em uma superfície, a pessoa toca nele e leva a mão às mucosas do rosto. O vírus pode sobreviver em superfícies por dois ou três dias.

Se não houver uma intervenção para conter o contágio, a cadeia de transmissão do vírus gera um ciclo vicioso que só acaba quando toda a comunidade estiver contaminada. Mas qualquer intervenção depende da capacidade de resiliência e do espírito de cidadania da população.

PREVENÇÃO

A principal forma de prevenção é o distanciamento. Quanto maior a proximidade, maior a chance de contaminação. Cerca de dois metros é a distância segura entre as pessoas, pois, além disso, o vírus cai sobre as superfícies. Por isso, as mãos e os ambientes precisam ser higienizados com água e sabão ou álcool 70%.

Outra medida essencial é o uso de máscara. A máscara comum, mesmo não tendo 100% de eficiência na filtragem, pode reduzir muito a quantidade de vírus em contato com o indivíduo. E se uma pessoa é infectada por uma quantidade pequena de vírus, provavelmente não apresentará sintomas ou serão mais leves.

É importante evitar os locais com condições favoráveis para a contaminação: festas, eventos, bares e restaurantes com bebidas alcoólicas. Observa-se que depois de beber as pessoas esquecem de seguir os protocolos de segurança. E as estatísticas mostram que se uma pessoa contaminada permanecer em uma reunião com outras pessoas por um longo período, metade de todos os presentes será contaminada.

FESTAS E VIAGENS

Com a chegada das comemorações de fim de ano, é preciso redobrar os cuidados. Se forem inevitáveis, as festas devem durar menos tempo e com o mínimo possível de pessoas. É preciso usar máscaras, evitar a proximidade, colocar álcool à disposição para a higienização das mãos, não compartilhar utensílios. Pessoas com sintomas de covid-19 e as que convivem com elas não devem participar.

Principalmente devido ao período de férias, os riscos de contágio em viagens são muito altos. Segundo o médico, se for inevitável, é mais prudente viajar para locais onde não tenha aglomeração, no próprio carro e com poucas paradas na estrada, dar preferência para hospedagem em casas e evitar restaurantes. Ele salienta que é mito a ideia de que o vírus não sobrevive ao calor do verão, pois seriam necessários mais de 50 graus para eliminá-lo.

REINFECÇÃO

O Dr. Estevão afirma que já tratou vários casos de reinfecção. Não se sabe ao certo quanto tempo dura a imunidade de quem teve a doença, mas, em geral, os anticorpos permanecem no organismo em torno de três meses. Quanto mais leves forem os sintomas da primeira infecção, mais rápido a pessoa perde a imunidade. Também não se sabe ainda o percentual de risco de reinfecção. Cabe ressaltar que a pessoa reinfectada transmite o vírus da mesma forma que as outras.

EXAMES E ISOLAMENTO

Na primeira semana de contágio, o exame que melhor identifica o vírus é o RT-PCR (swab nasal). A partir da segunda semana há uma redução na carga viral em função das defesas do próprio organismo e, por isso, esse exame pode dar negativo. Assim, a partir do 8º ou 10º dia, o exame que melhor identifica a doença é a pesquisa de anticorpos no sangue. 

Se o exame der positivo, o tempo de isolamento da pessoa é de 10 dias, desde que ela esteja bem. Não há necessidade de contraprova, exceto se ainda houver sintomas.

A pessoa diagnosticada com covid-19, que não precisar de internação, deve permanecer isolada em casa, num quarto separado dos demais familiares, de preferência bem ventilado. A pessoa e todos que tiverem contato com ela devem usar máscara, além de fazer a higiene constante das mãos e de todas as superfícies que o infectado tiver contato. Os utensílios pessoais devem ser separados. Os outros moradores da casa também devem permanecer em isolamento social.

SINTOMAS E SEQUELAS

O vírus ataca mais comumente os pulmões e o tubo digestivo, causando sintomas como tosse, dor de garganta, diarreia e vômitos. Mas pode afetar diversos outros órgãos. A doença aumenta as chances de trombos e embolias.

Além disso, a covid-19 pode deixar marcas. “Temos visto todo tipo de sequelas”, afirma o médico. O doente pode ter prostração e fraqueza por mais de três meses. Além disso, podem ocorrer sequelas pulmonares, cardíacas e hepáticas graves, que afetarão a qualidade de vida de forma permanente.

EVOLUÇÃO DA DOENÇA E TRATAMENTO

Infelizmente, de cada 100 pessoas que se contaminam, cerca de 20 desenvolvem formas graves da doença e de três a cinco morrem, principalmente as que têm alguma comorbidade como doenças respiratórias, obesidade, diabetes e hipertensão arterial descontroladas.

“Nesse momento, sabemos que há uma mutação do vírus circulando na Europa, com maior capacidade de infecção, e que certamente já chegou por aqui. Nessa segunda onda, cada vez mais temos visto pessoas jovens e sem comorbidades morrendo pela doença”, afirma o infectologista.

O vírus piorou e o tratamento não evoluiu muito. O principal tratamento para os casos mais graves tem sido o uso de corticoides e anti-inflamatórios, que têm reduzido em cerca de 30% a mortalidade.

O grande debate está no tratamento precoce da covid-19. O uso de medicamentos como ivermectina, cloroquina, vitamina D, entre outros tem sido discutido, mas nenhuma das grandes instituições internacionais sugere o uso precoce com base nas evidências. Existem trabalhos metodologicamente frágeis que sugerem que o uso de alguns desses medicamentos pode reduzir os riscos de casos mais graves. Contudo, estudos mais robustos não demonstraram evidências. Uma das dificuldades de resposta está no fato de que a grande maioria das pessoas evolui bem, naturalmente, em relação à doença. Assim, é difícil saber se isso se deve a algum remédio.

Academicamente, não existem protocolos para o uso destes medicamentos. Por outro lado, alguns médicos têm indicado o uso, baseados em sua experiência clínica. Nesse momento de incertezas em relação à doença, cabe ao médico decidir junto ao paciente, em comum acordo, sobre o uso de qualquer medicação.

PERSPECTIVAS  E VACINA

Nesse momento de segunda onda, é irresponsabilidade das autoridades deixar a seleção natural agir. É fundamental orientar a população para continuar a se prevenir. A vacina está próxima e não faz sentido perder esse jogo na prorrogação. Quem se protegeu até agora não pode se descuidar na reta final.

A vacina deve chegar ao Brasil no primeiro trimestre de 2021. Estudos clínicos já comprovaram sua segurança e eficácia. Muitos questionam sua confiabilidade pela velocidade com que foi produzida, mas nunca se investiu tanto dinheiro no desenvolvimento de uma vacina e foi isso que viabilizou resultados mais rápidos. “O que não sabemos é por quanto tempo ela mantém o indivíduo imunizado. Isso depende de tempo e não de dinheiro. De qualquer forma, não tomar a vacina, quando ela estiver disponível, é se arriscar demais”, conclui o médico.