Em palestra virtual promovida pela Unidade de Serviço de Saúde e Segurança do Trabalho da Copasa, Edmar apresentou reflexões sobre a complexidade da dependência química e a forma de abordagem do assunto pela sociedade. 

Segundo o psicólogo, os efeitos da droga dependem da interação de três elementos: as propriedades farmacológicas da substância (estimulante, depressora ou perturbadora); a pessoa que a usa, suas condições físicas e psíquicas, inclusive suas expectativas; e o contexto e a cultura de uso, como as companhias, o ambiente, as influências.

A dependência química é algo complexo e passa, o tempo todo, por questões individuais. Não adianta defini-la com pensamentos simples ou tirar conclusões instantâneas. Beber ou usar droga é um comportamento determinado por fatores diversos.

Os aspectos biológicos são determinantes para o uso da droga e do álcool. Alguns organismos são mais predispostos a se tornar dependentes. Fatores genéticos têm um peso importante nisso.

Os aspectos psicológicos também são impulsionadores. “Para uma pessoa tímida, por exemplo,  o álcool, em determinadas situações, pode ter uma funcionalidade, fazendo com que a pessoa se sinta mais à vontade. O problema está na repetição do ato. Tudo começa pequeno. Ninguém se torna dependente na primeira dose. O processo é lento”, ressaltou Edmar.

É preciso considerar ainda os aspectos socioculturais. Muitas famílias e grupos na nossa sociedade têm a cultura de beber para festejar. Por isso, há um estranhamento com quem não bebe.  É preciso entender que o grupo em que estamos inseridos influencia e até controla o nosso comportamento. Muitas vezes, a pessoa quer parar de beber, mas sua tentativa é questionada pelo grupo. É como se fosse uma prisão. “Quem não bebe, na nossa cultura, parece que vira um E.T.”, salientou o psicólogo.

Como referência ao dia 18 de fevereiro, que é o Dia Nacional de Combate ao Alcoolismo, Edmar destacou a palavra combater. “Combater é lutar contra um inimigo e, para isso, é preciso conhecê-lo.”

Para enxergar esse inimigo, é bom acender a luz amarela para verificar a forma como a pessoa está se relacionando com a bebida. É importante analisar a trajetória do indivíduo. Cada droga pode agir de um jeito diferente, mas os sinais da dependência são semelhantes. Se a pessoa percebe que a bebida ou droga está se tornando algo central na sua vida, é hora de ligar o alerta. O psicólogo alertou sobre a importância de estar atento à diferença entre escolher e precisar. A dependência surge na transição entre estes dois verbos.

Edmar mostrou que há várias formas de perceber os sinais. Se ao consumir pouca quantidade a pessoa já fica alterada; se é preciso aumentar a quantidade consumida para obter a mesma sensação, ou se há sofrimento com a parada do consumo. Ao retirar de perto o que causa a dependência é que ela é percebida.

Dependência e abstinência são faces da mesma moeda. Assim como se constrói a dependência, é preciso construir a abstinência.  Recaídas fazem parte deste processo. Mas a pessoa precisa se envolver e não desanimar.

Assim como não existe uma só entrada para a dependência, também não existe uma única saída. São muitos meios. O melhor remédio, segundo Edmar, é a informação. Outro são os programas e grupos de apoio. E o tratamento psiquiátrico também é um importante aliado, pois a raiz da dependência pode estar em outras comorbidades, como a depressão.

O que não ajuda é ignorar a dependência química porque ela é uma doença sistêmica que afeta não só o doente, mas também a família, os amigos, o ambiente de trabalho. É preciso olhar com atenção para essa dependência, que, de início, é uma paixão, mas acaba se tornando uma grande adversária.

Outra questão importante colocada pelo psicólogo é a construção que a sociedade faz  da identidade do dependente químico. Alcoólatra, alcoolista, alcoólico, bêbado “são todos termos que conferem uma identidade ao indivíduo e impõem um estigma – que anula todas as outras identidades do sujeito -, tornando-o tão somente aquilo que ele faz e pelo qual é socialmente condenado.”

A influência do grupo, quando dá um nome,  é sutil, mas determina o lugar daquela pessoa na sociedade, sem levar em conta que a dependência é só uma dimensão da vida da pessoa. Não é tudo. E o rótulo de dependente torna mais difícil qualquer intervenção ou ação para mudar.

Por isso, Edmar ressaltou que é muito importante o cuidado com as palavras, com os termos que usamos para classificar as pessoas porque eles têm o poder de conferir identidade e, assim, estigmatizar, reduzindo a pessoa a uma única condição, apagando ou negando todas as suas demais identidades como pai, mãe, amigo, trabalhador etc.

Neste período de angústia e ansiedade que a humanidade vive em função da pandemia, é de se esperar que a dependência química aumente, pois o nosso comportamento é determinado pelo momento. Por isso, o psicólogo aconselha: “Hoje, se você tiver que tomar alguma coisa, que seja cuidado!”