Não há evidências de uma relação direta com a doença. Para a Dra. Luciana Macedo, pneumologista e uma das coordenadoras do Laboratório do Sono, do Hospital Madre Teresa, a insônia decorrente da covid-19 está associada à angústia, depressão, preocupação, ansiedade, redução da atividade física e maus hábitos adquiridos durante o período. “Sabemos que a pandemia gerou um aumento dos casos de angústia e depressão, que são comorbidades que podem causar insônia.”

 

 

 

 

 

QUE FATORES LEVAM À INSÔNIA?

A médica explica que, geralmente, para a insônia existir é preciso haver um fator precipitante, como, por exemplo, uma morte na família ou preocupação com dificuldades financeiras. Assim, a covid-19 pode ter sido fator precipitante para uma insônia situacional. Mas para que essa insônia se mantenha é necessário haver um fator perpetuador, como não tratar a depressão que surgiu ou não cuidar da higiene do sono, que são medidas que a pessoa precisar adotar em sua rotina para facilitar o sono.

A insônia também pode ter característica genética, conhecida como insônia primária, ou pode acontecer sem nenhuma causa associada, chamada de insônia psicofisiológica. Nesse caso, ocorre um estresse canalizado para a hora do sono, em que a pessoa qualifica o sono como um momento difícil do seu dia e passa a se preocupar com a hora de dormir, achando que não vai conseguir adormecer.

 

SINAIS DA INSÔNIA

O primeiro sinal a ser observado é se a pessoa acorda frequentemente com a sensação de que não dormiu bem, que o sono não foi reparador. A insônia pode ser de iniciação, quando a pessoa tem dificuldade de pegar no sono ao se deitar, mais comum nos ansiosos. E pode haver a insônia de manutenção, que se caracteriza pelo sono picado, quando a pessoa desperta várias vezes à noite, ou quando tem o despertar precoce. Esse último tipo é mais comum nos quadros de angústia e depressão.

Mas, segundo a Dra. Luciana, para concluir que uma pessoa tem insônia é preciso, primeiro, afastar o diagnóstico de outros distúrbios do sono, como apneia, sonambulismo, entre outros. Quem tem apneia do sono, por exemplo, geralmente acorda cansado, mas não tem dificuldade para dormir e, sim, um sono fragmentado.

Outra característica do insone é ser hiperalerta, ou seja, é uma pessoa com o olhar cansado, mas agitada. Quando o indivíduo passa o dia sonolento é mais provável que ele tenha outro tipo de distúrbio do sono, como a apneia.

 

TRATAMENTO

O primeiro passo, utilizado para a maioria das pessoas, é o tratamento comportamental, que é o mais seguro e duradouro e tem bons resultados, afirma a pneumologista. Ele consiste em várias técnicas que ensinam o paciente a fazer com que o seu sono chegue naturalmente, ou seja, é uma mudança na rotina da pessoa para que ela consiga fazer uma boa higiene do sono (veja no quadro abaixo).

A medicação é utilizada somente nos casos mais graves. Muitas vezes, segundo a médica, quando o paciente realmente não consegue dormir, é preciso iniciar a medicação antes mesmo que o tratamento comportamental tenha algum efeito. Além disso, a medicação é indicada para aquelas pessoas que não conseguem resultado com o tratamento comportamental ou não têm as condições para adotá-lo ou têm alguma doença associada, enfim, algum motivo que impeça a adoção das medidas de higiene do sono.

A Dra. Luciana salienta que antes de iniciar qualquer medicação para dormir, é muito importante investigar se há outros distúrbios do sono para evitar que o paciente seja medicado de forma equivocada, fazendo com que o distúrbio se agrave. “O médico pode receitar remédios que relaxam as vias aéreas superiores e se, ao invés de insônia, o paciente tiver apneia ou refluxo, isso vai piorar o quadro.”

 

 

 

 

MEDICAÇÕES “POPULARIZADAS”

Sabe-se, hoje, que medicamentos já usados em larga escala, como os sedativos benzodiazepínicos, não são ideais para a indução do sono. Atualmente, estas medicações são mais reservadas para quadros de ansiedade extrema ou síndrome do pânico. Além de causarem dependência, elas têm vários efeitos colaterais como aumento do relaxamento das vias aéreas superiores, precipitação de demências e quedas em idosos, aumento do sono leve e redução do sono profundo, que é o que descansa.

Hoje, o mais indicado, para além do tratamento comportamental, são os medicamentos sedativos não benzodiazepínicos. Entre eles, os mais usados são os antidepressivos, pois em dosagens mais baixas eles funcionam como sedativos e são seguros para o uso, com poucos efeitos colaterais.

O Zolpiden, muito popular atualmente, é um destes medicamentos sedativos não benzodiazepínicos. Ele foi desenvolvido para tratar a insônia aguda, temporariamente, por alguns meses. O problema, segundo a pneumologista, “é que ele começou a ser usado em larga escala e à revelia, de forma permanente, sob a falsa ideia de que não causa dependência. Não existem ainda trabalhos que assegurem o uso deste medicamento por longos períodos. O que se percebeu com isso é que ele tem causado nesses usuários efeitos colaterais como perda de memória recente.” Por isso, a orientação médica é descontinuar o tratamento prolongado com o Zolpiden.

 

Melatonina, uma arma potente contra a insônia

Bastante popular hoje em dia, principalmente entre os jovens, a melatonina é uma grande arma para o combate à insônia, diz a Dra. Luciana. Conhecida como “hormônio do sono”, ela é classificada como um suplemento e não um medicamento, pois é uma substância que o organismo também produz. De acordo com a médica, “ela é mais indicada para aquelas pessoas que têm pouco contato com o sol, como idosos que vivem em asilos, pessoas sedentárias, pessoas que viajam e são submetidas a mudanças de fuso horário com muita frequência. Além disso, mesmo em pacientes que não se enquadram nessas condições, a melatonina tem sido usada com uma boa resposta. Inclusive é possível, com o seu uso, ‘desmamar’ o uso de outros remédios para dormir, aliando-o a ajustes na higiene do sono e atividade física.”

“Em geral, a melatonina deve ser ingerida pelo paciente ao deitar-se, já com as luzes apagadas. Para pessoas que têm que dormir mais tarde, como aquelas que trabalham à noite ou têm o sono mais atrasado, a melatonina pode ser usada em dose baixa, durante o dia, para antecipar o sono da noite”, afirma a pneumologista. Ela complementa que existem diversos trabalhos que comprovam que o uso da melatonina na dosagem adequada é seguro e não tem efeitos colaterais.

É importante ressaltar que qualquer medicamento para indução do sono deve ser utilizado somente com indicação e sob supervisão médica. É fundamental que o médico faça o diagnóstico para prescrever a medicação certa, na dosagem e horário adequados, quando necessário.

 

HIGIENE DO SONO

A adoção das práticas de higiene do sono é o melhor e mais eficaz tratamento para a insônia, na maioria dos casos. Confira as principais orientações, de acordo com a Dra. Luciana Macedo:

. Praticar atividade física regular. Esse é o melhor remédio para induzir o sono à noite. Porém, o exercício deve ser praticado até quatro horas antes de dormir, para evitar que o cortisol liberado no organismo mantenha a pessoa alerta. Se o único horário disponível para fazer os exercícios é à noite, é recomendado buscar a ajuda de um especialista em sono para orientar a adoção de medidas complementares;

. A partir do meio da tarde, evitar o consumo em excesso de alimentos que contenham cafeína, como café, refrigerantes, achocolatados, chá preto e outros;

. Ter uma alimentação menos volumosa e mais leve à noite, evitando massas, açúcar e frituras, e fazer a última refeição cerca de duas horas antes de dormir;

. A partir de uma certa hora da noite, idealmente após a última refeição, manter as luzes da casa na penumbra. É necessária a ausência de luz para que o organismo produza a contento o hormônio melatonina, que induz o sono;

. Ir para a cama apenas quando estiver com sono. Não é recomendado ir se deitar para esperar o sono chegar;

. Não ver televisão ou outros aparelhos eletrônicos deitado ou no quarto de dormir;

. Cuidar para que o ambiente do quarto tenha boas condições de temperatura, silêncio e pouca luminosidade;

. Manter uma rotina de vida com horários bem definidos como, por exemplo, fazer as refeições e ir para a cama nos mesmos horários habitualmente.