Diante de números que podem ser reduzidos, o Novembro Roxo, mês internacional de sensibilização quanto à prematuridade, e o Dia Mundial da Prematuridade (17/11), trazem visibilidade a uma realidade que precisa ser bem compreendida.  

Na entrevista abaixo, a Dra. Tilza Tavares, pediatra neonatologista do Neocenter Maternidade e autora do livro “Pequenos Guerreiros - A força de vida do bebê prematuro”, fala sobre as causas, consequências e a forma de prevenção do parto prematuro. Dra. Tilza ainda provoca uma reflexão sobre as particularidades que envolvem o universo da prematuridade.

 

 

 

Copass Saúde: O que caracteriza a prematuridade?

Dra. Tilza: É prematuro todo bebê que nasce antes de 37 semanas de gestação. O parto é considerado viável para a sobrevivência do bebê a partir de 22 semanas. Aqueles que nascem antes de 28 semanas são chamados de prematuros extremos. Os que nascem entre 28 e 34 semanas são moderados e os nascidos entre 34 e 36 semanas e seis dias são considerados prematuros tardios.

 

Copass Saúde: Quais situações podem levar à necessidade de um parto prematuro?

Dra. Tilza: As condições que tornam o parto necessário são, principalmente, situações em que a mãe tem alguma comorbidade, como pressão alta, diabetes, algum tipo de infecção. Também são comuns os casos de insuficiência placentária - quando a placenta não consegue nutrir o bebê adequadamente, dificultando seu desenvolvimento -, o rompimento precoce da bolsa e casos de incompetência istmo cervical, que é quando o colo do útero vai abrindo durante a gestação. Além disso, grávidas que já tiveram partos prematuros e as gestações múltiplas têm o risco aumentado.

 

Copass Saúde: É comum ocorrer o parto prematuro sem necessidade?

Dra. Tilza: Há um tempo, isso era mais comum, mas vem diminuindo bastante. Já é rara aquela cesárea programada em que o bebê tem até 38 semanas. Antes, a mãe e o médico faziam uma programação, agendando a data do parto, porém sem indicações específicas para o adiantamento. Ao longo da minha experiência em neonatologia, vi muitos bebês nascerem de 37 ou mesmo 38 semanas, que ainda não estavam prontos. O índice de cesáreas no país sempre foi alto. Mas a conscientização a respeito disso melhorou muito. O bebê tem a hora de nascer e isso vai acontecer quando ele estiver pronto. Atualmente, a recomendação para a realização de cesáreas eletivas, aquelas agendadas, é só a partir de 39 semanas de gestação. Graças a isso, hoje, a realização de partos prematuros está mais relacionada às condições de saúde da mãe e do bebê, que colocam em risco a continuidade da gestação. Mesmo assim, ainda temos quase 12% dos nascimentos no Brasil por partos prematuros, um índice alto em relação a outros países.

 

Copass Saúde: É possível prevenir ou reduzir esse número elevado de prematuridade? Como?

Dra. Tilza: Sim. A base para evitar o nascimento prematuro é o pré-natal, com o acompanhamento adequado das condições da gestante, que deve seguir cuidadosamente as orientações. Quem vai coordenar e garantir o cuidado necessário para cada situação é o obstetra. É preciso fazer os exames, manter o controle das comorbidades existentes, enfim, fazer um bom pré-natal e seguir em frente com atenção e cuidado.

Quando a gestante é cercada de informação e assistência adequada, reduz-se a probabilidade de um parto prematuro. Contudo, se há uma condição que traga riscos para a mulher, para o bebê ou para os dois, a decisão pela realização do parto prematuro é sempre do médico obstetra.

 

Copass Saúde: Quais as consequências do parto prematuro para a mãe e para o bebê?

Dra. Tilza: Isso vai depender muito de quão prematura a criança nasceu. Um bebê que nasce com 24 semanas é muito diferente de um que nasce com mais de 30 semanas, por exemplo.

Quanto mais imaturo, maiores os riscos de uma saúde mais frágil. Nos prematuros tardios, aqueles que nascem próximo de 37 semanas, uma das consequências mais comuns são problemas respiratórios, visto que o pulmão é o último órgão a ser desenvolvido na gestação e vai precisar amadurecer fora da barriga da mãe. Já os bebês muito prematuros têm mais riscos de desenvolver displasia pulmonar (DBP), o que pode gerar problemas como bronquite e asma. Vale lembrar que o bebê prematuro não é doente, é imaturo. É preciso esperar o processo de amadurecimento e, durante esse tempo, é muito importante que ele tenha todo o suporte possível, para que não ocorra nenhum evento que possa gerar complicações.

As consequências para a mãe estão mais ligadas à questão psicológica. Ela vai ter que aprender a esperar o amadurecimento do bebê. E isso atinge toda a família. A gente costuma falar que quando nasce um prematuro, nasce uma família prematura também, pois, geralmente, os pais se preparam para cuidar de um bebê que nasce a termo. Eles terão que passar pelo processo de entendimento do cuidado daquele bebê e terão uma caminhada pela frente. Isso é mais evidente naquelas famílias onde a gravidez está correndo bem e acontece algo que gera a necessidade do parto prematuro, mudando todo o cenário. Quando a família sabe que existe o risco, ela já vai se preparando para lidar com uma possível prematuridade.

 

Copass Saúde: O tema global do Dia Mundial da Prematuridade de 2022 é “Garanta o contato pele a pele com os pais desde o momento do nascimento”. Como esse contato beneficia o prematuro?

Dra. Tilza: O contato é fundamental para a criação do vínculo, principalmente, entre a mãe e o bebê. Antes, os bebês nasciam e iam para o berçário. Hoje já se sabe da importância do contato com a mãe na primeira hora do nascimento para a criação do vínculo. Para o prematuro, o vínculo é ainda mais essencial, mas as condições para mantê-lo junto da mãe dependem do grau de imaturidade no nascimento. A gente sempre tenta deixar o bebê com a mãe o máximo de tempo possível, de acordo com as suas possibilidades, antes de levá-lo para monitorização. Depois, os pais podem ficar na U.T.I., acompanhando o bebê o tempo que quiserem.

Percebe-se que quando o bebê vai para o colo da mãe, os sinais vitais dele ficam mais estáveis. Quando ela conversa com o bebê, a frequência cardíaca e a oxigenação melhoram. Além disso, o contato com a mãe também estimula a produção do leite. Por isso, é preciso estimular o toque e o cuidado canguru assim que possível, para fortalecer o vínculo com a mãe e com o pai, que também é muito importante nesse momento.

 

Copass Saúde: A campanha Novembro Roxo busca a sensibilização das pessoas quanto às particularidades da prematuridade. Qual a importância da conscientização e apoio da família e da sociedade?

Dra. Tilza: A cor roxa da campanha não foi escolhida por acaso. Ela simboliza essa magia da transformação da vida, a sensibilidade que está presente no prematuro. Deste modo, tanto a família quanto a sociedade precisam entender e acolher essa peculiaridade.

Enquanto estão na U.T.I, o que mais me fascina nesses bebês é a capacidade que eles têm de lutar pela vida. Assim, penso que a primeira coisa a fazer é acreditar neles. Se eles estão ali, teimando pela vida, precisamos lutar junto com eles. Nesse contexto, a palavra de ordem é serenidade, tanto para a família quanto para os profissionais que assistem ao bebê. É ter tranquilidade para enfrentar a fase de maturação da criança e acreditar que ela pode vencer. O prematuro pede isso. Eu não tenho dúvidas que o bebê sente quando há serenidade em torno dele e reage melhor.

A prematuridade é sustentada por três pilares: a prevenção, o cuidado e o acolhimento. A criança que nasceu prematura não apresenta nenhum traço físico que a diferencie, mas a prematuridade acompanha a pessoa por um bom tempo. O prematuro pode se desenvolver, ter o cognitivo normal, mas, em geral, torna-se uma pessoa mais sensível, com uma personalidade mais delicada. Por isso, o acolhimento que ele recebe ao nascer precisa ter continuidade na vida, principalmente, no ambiente escolar. É importante que a sociedade se atente para isso. O conhecimento sobre o início de vida deste indivíduo deve ser considerado, pois os desafios que ele teve que superar na sua luta pela sobrevivência podem ter reflexos ao longo da sua caminhada, no seu comportamento e na formação da sua personalidade. Um olhar mais cuidadoso e acolhedor pode ser transformador na história dessa pessoa.

 

Fontes:

Agência Brasil

ONG Prematuridade

Biblioteca Virtual em Saúde – Ministério da Saúde