A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a violência contra pessoas idosas como ações que prejudicam a integridade física e mental do indivíduo, impedindo ou anulando seu papel social. De acordo com o Estatuto da Pessoa Idosa (Lei Federal nº 10.471/2003) é obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do poder público, com absoluta prioridade, assegurar a dignidade da pessoa idosa, mantendo-a a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.

Segundo Gabrielle Capaz, assistente social do PAD- Programa de Atenção Domiciliar da Copass Saúde, a pessoa idosa é um alvo fácil por sua condição, geralmente, mais frágil. “É muito sofrido para quem já passou por tantas coisas, ao final de sua vida, ter que enfrentar a humilhação, o constrangimento e a dor da violência. E tem muitas pessoas idosas que não têm a consciência de que isso é errado, dos seus direitos.”

Essa violência  é mais comum do que se imagina e, muitas vezes, pode estar bem perto de nós. Ocorre com maior frequência em ambientes de maior vulnerabilidade social, mas está presente em todas as classes sociais. Conforme dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, somente nos primeiros cinco meses de 2023, foram registradas mais de 47 mil denúncias que apontam para violações de direitos contra essa faixa etária.

A violência contra a pessoa idosa é classificada de várias formas, como negligência (a mais frequente), abandono, violência física ou sexual, psicológica e financeira ou material.

COMO IDENTIFICAR

Para Gabrielle Capaz, a agressão física é a mais fácil de perceber. Beliscões, tapas, socos, empurrões acabam deixando marcas no corpo. Os casos de negligência são reconhecíveis através do ambiente em que a pessoa vive e por suas condições de saúde. Já a violência psicológica é a mais difícil de ser identificada, principalmente, porque os mais velhos tendem a ser mais calados em função da idade e da fragilidade.

Mesmo quando não se vê marcas, a violência deixa sinais. A assistente social explica que é importante observar mudanças de comportamento. “Quando sofre agressões psicológicas, a pessoa idosa fica mais triste, busca o isolamento, não consegue expressar o que está sentindo. Isso acontece, muitas vezes, porque, dependendo de sua condição mental, a pessoa volta a agir como uma criança e não entende bem o que está acontecendo, nem como pedir ajuda. A mudança de comportamento também é perceptível na agressão física porque a pessoa tende a esconder as marcas, deixando o corpo mais coberto, principalmente, os braços, que são um ponto mais frequente de agressões.”

Quando o idoso está sofrendo violência por alguém da própria família, o que é bastante comum, a situação é mais delicada. “Muitas vezes, outros familiares acabam acobertando o agressor por medo das consequências que ele pode sofrer”, ressalta Gabrielle. Além disso, é comum que um terceiro, geralmente da própria família, tome conta do dinheiro da pessoa idosa, surgindo daí a violência financeira ou material.

 

O PAPEL DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

Para Gabrielle Capaz, o profissional de serviço social é fundamental na questão da violência porque é formado para garantir os direitos das pessoas e promover sua proteção. “Não podemos, de forma alguma, ser omissos diante de qualquer suspeita.”

Mas não é um trabalho isolado. Muitas demandas chegam através de outros profissionais que têm contato mais estreito com o paciente, como o enfermeiro, o fisioterapeuta, o médico. O trabalho em equipe é fundamental para a percepção dos sinais, juntando pequenos detalhes. “É como montar um quebra-cabeça, literalmente. Cada profissional que lida com o paciente traz algum fato ou informação que evidenciam que algo não está bem. Acontece muitas vezes de, na presença de um profissional, as pessoas agirem diferente ou ‘maquiarem’ a situação. Por isso, é  preciso ter um olhar amplo e crítico e manter o acompanhamento da situação para chegar a uma conclusão confiável e juntar provas sobre o que realmente está ocorrendo”, diz Gabrielle.

O segundo passo é acionar os órgãos competentes, como o Conselho do Idoso ou o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) da região. Quando a suspeita de violação dos direitos é confirmada, o caso vai para o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS). Estes órgãos têm total capacidade de tomar as medidas necessárias para garantir a proteção da vítima.

O assistente social precisa entender todo o contexto em que a pessoa idosa está inserida porque a violência pode estar por trás de outros problemas apresentados pelo paciente. Quando o agressor é alguém da família, é preciso ter todo o cuidado para tentar identificar entre os familiares alguém que não esteja por trás dessa violência e consiga intervir de forma eficiente.

Por outro lado, salienta Gabrielle, uma suspeita de maus tratos pode revelar uma insuficiência familiar, que ocorre quando o cuidador não tem condições para assumir este papel de forma adequada. Nesses casos, o cuidador não é um agressor e precisa de atenção tanto quanto a vítima. “É muito comum o cuidador adoecer mentalmente quando não é preparado para enfrentar a rotina de cuidados com a pessoa idosa. “

COMO AGIR

Quando há uma denúncia e o acompanhamento da situação, as famílias, geralmente, se mobilizam para melhorar as condições e impedir a violência. A pressão exercida sobre aquela família faz com que se tomem as atitudes necessárias, afirma a assistente social.

A presença firme da família é muito importante, mas a pessoa idosa também é de responsabilidade da sociedade e do Estado. Pessoas que ficam em instituições de longa permanência, por exemplo, precisam da atenção de todos que atuam nestes locais.

Assim, qualquer um que presencie, perceba ou tome conhecimento de algum tipo de violência contra a pessoa idosa tem a obrigação de acionar um órgão competente para tomar as medidas de proteção necessárias.

COMO DENUNCIAR

Qualquer pessoa pode e deve denunciar, mesmo de forma anônima.  o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania disponibiliza o Disque 100, que funciona 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados. As ligações são gratuitas e sigilosas, bastando teclar o número 100 pelo telefone fixo ou celular de todo o Brasil. O serviço pode ser acessado ainda pelo site da Ouvidoria de Direitos Humanos, aplicativo Direitos Humanos, Telegram (digitar na busca “Direitoshumanosbrasil”) e WhatsApp (61) 99611-0100). O canal também possui atendimento em Libras.

Além do Disque 100, as denúncias podem ser feitas em unidades básicas de saúde, delegacias e Polícia Militar (por meio do 190) para situações de risco eminente.