Segundo a Dra. Valéria Maria Carvalho, pediatra e psicanalista da equipe do Hospital Felício Rocho, a saúde mental está ligada à experiência da criança na vida e isso passa pela atividade física. No consultório, ela constata que os pacientes ativos fisicamente são mentalmente mais saudáveis.

A médica explica que atividade física vigorosa - aquela que exige grande esforço físico, acelera o ritmo da respiração e aumenta os batimentos cardíacos - é fundamental para crianças e adolescentes porque, entre outros benefícios, aumenta a atividade no hipocampo, área do cérebro associada à memória e ao aprendizado.

Além de melhorar o sistema imunológico e prevenir uma série de doenças, a atividade física favorece a socialização e pode reduzir os sintomas de depressão e ansiedade, melhorar o pensamento, a aprendizagem e o bem-estar geral.

É fato que o exercício físico precisa ser parte da vida de crianças e adolescentes, mas a realidade mostra um caminho contrário. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 78% das crianças e 84% dos adolescentes brasileiros não fazem o mínimo de atividade física recomendada por dia. Isso se deve, em grande parte, ao tempo dedicado ao uso das telas pela população infanto-juvenil.

 

FORA DO VIRTUAL

Hoje as crianças e adolescentes gastam um tempo excessivo diante das telas da TV, celular, jogos, o que traz prejuízos importantes para a saúde. De acordo com a Dra. Valéria, as telas de vídeo são terríveis para áreas fundamentais do desenvolvimento humano, principalmente quando utilizadas à noite. Ficar parado diante de uma tela, recebendo um volume enorme de informações e estímulos que o organismo não dá conta de processar, gera estresse físico e mental.

A pediatra afirma que o antídoto para diminuir o estresse da tela é a prática de atividade física vigorosa ao ar livre e, de preferência, em áreas verdes, pelo menos uma vez por semana. Além da atividade diária, correr, fazer caminhadas, trilhas, escaladas, andar de bicicleta, em contato com a natureza, são um remédio para manter a saúde física e mental.  

Por outro lado, as consequências são inevitáveis quando é necessário restringir o acesso ao ar livre e aumentar o uso das telas, como aconteceu durante a pandemia de covid-19.

 

SEQUELAS PÓS-PANDEMIA

A pandemia de covid-19 deixou um rastro de preocupação com a saúde física e mental de crianças e adolescentes. Segundo a pediatra, ficar presa é a pior coisa que pode acontecer a uma criança. O resultado de todo o estresse do período da pandemia são inúmeros casos de crianças fóbicas, que não conseguem ir à escola, com problemas cognitivos, sociais e sexuais, além do aumento das tentativas de suicídio e da obesidade.

 

OS RISCOS DA OBESIDADE

O aumento de peso nessa faixa etária é um capítulo à parte. De acordo com o Ministério da Saúde, mais de seis milhões de crianças atendidas pela Atenção Primária à Saúde no Brasil têm excesso de peso e mais de três milhões delas já evoluíram para a obesidade. Entre os adolescentes, o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional de 2019 revelou que 18% têm sobrepeso, 9,53% são obesos e 3,98% apresentam obesidade grave. 

“Uma roda que roda para trás.” Assim a Dra. Valéria define o problema da obesidade para crianças e adolescentes. “Quanto mais obeso o paciente, mais preguiçoso e com mais dificuldade para a prática de atividade física. E quanto mais sedentário, mais obeso.”

O sobrepeso e a falta de atividade física são gatilhos para o desenvolvimento e agravamento de doenças físicas e mentais como a diabetes e a depressão.

 

O QUE FAZER PARA SAIR DO SEDENTARISMO?

Os pais têm papel fundamental nessa história, afirma a Dra. Valéria. Para convencer as crianças e adolescentes a sair do sedentarismo, o primeiro passo é entender a importância de dar o exemplo. “Se os pais não largam o celular, não terão como convencer os filhos a fazer isso.”

Também é preciso buscar atividades que caibam na rotina da família para que possam ser feitas com regularidade. Isso é relevante porque não adianta falar com a criança para fazer atividade se não houver alguém que possa se responsabilizar por levá-la. É preciso se dispor a assumir essa função, salienta a médica.

Os pais podem ficar atentos aos sinais de que está faltando atividade física na vida dos filhos. Aquelas crianças que têm alterações bruscas de humor, que sofrem muitos traumas (machucam muito), que adoecem com frequência, que ficam sonolentas de dia e com insônia à noite, que têm queda no rendimento escolar, que ficam menos sociáveis, com baixa autoestima, vão se beneficiar muito se forem incentivadas a praticar atividade física regular.

Esse processo fica mais fácil quando a criança pode escolher o tipo de atividade física que mais lhe agrada. “Mas tem que fazer”, ressalta a pediatra. Pode ser uma batalha, mas não há escolha para quem quer filhos mais saudáveis.

A ATIVIDADE IDEAL PARA CADA FASE

A Dra. Valéria orienta sobre a quantidade e os tipos de atividade física ideais para cada fase do desenvolvimento:

  • De um até os três anos de idade, são necessários, pelo menos, 180 minutos por dia de atividade física de qualquer intensidade. Dos três aos cinco anos, mantém-se os 180 minutos, porém com pelo menos uma hora por dia de atividade moderada a vigorosa, em espaços que permitam que a criança movimente todo o seu corpo. Vale lembrar que, a partir dos quatro anos, para prevenção de acidentes, as crianças precisam aprender a nadar.
  • A partir dos seis anos, no mínimo, uma hora por dia de atividade física de intensidade moderada a vigorosa. É importante buscar atividades e jogos que tenham adversários, pois ajudam a criança a entender limites, saber trabalhar em equipe, respeitar regras, o espaço e o direito do outro. Atividades como futebol, handebol, basquete são bons exemplos.
  • Para os adolescentes que já desenvolveram a puberdade, é indicado atividades que estimulem força, como musculação, que deve ser feita todos os dias, por, pelo menos, meia hora.

 

Fontes:

Sociedade Brasileira de Pediatria

Ministério da Saúde

Organização Pan-americana de Saúde